Até novembro de 2019 tudo ia como
sempre vinha sendo. Mudanças climáticas evidentes eram debatidas pelos
políticos e as teses cientificas eram contestadas por uns poucos mandatários.
“Não acredito." Com estas palavras o
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, derruba 1.656 páginas de um
relatório que detalha os devastadores efeitos da mudança climática para a
economia, a saúde e o meio ambiente. Pouco ou nada importa ao mandatário que o
estudo seja respaldado por 300 cientistas de 13 agências federais, e que sua
preparação seja uma exigência legal. (El Pais 2018, nov 27 (¹)
Sustentados pelo poderio bélico, mais que pela
força econômica de seus países, esses céticos se sentiam soberanos sobre a Natureza.
Capazes de ignorar os sinais nefastos das intervenções humanas sobre o planeta do
qual surgiram todas as espécies de vida.
Generosa, a Natureza sofria as consequências,
mas nem por isso deixava de prover condições para que as várias vidas dela se
sustentassem.
Poluição do ar, da água, desmatamento, desertificação
de terras férteis, perda da biodiversidade, acúmulo de dióxido de carbono na
atmosfera, e exploração dos recursos naturais em proporções muito superiores às
que a Terra era capaz de repor, eram sintomas evidentes.
Miséria, fome, falta
de acesso a água potável e saneamento, desigualdades sociais graves, e guerras,
por exemplo, de um lado; opulência, consumo exagerado, queima desmedida de
combustíveis fósseis, investimentos bélicos colossais, palácios suntuosos, só
para citar alguns pontos, de outro faziam o quadro do paradoxo da dita evolução
da Humanidade.
Ao longo da História
a Terra se sacudiu algumas vezes como um animal que acaba de se banhar. Tudo na
Terra é dinâmico, nada é estatíco.
Evidências
geológicas, químicas e paleontológicas indicam a ocorrência de cinco eras
glaciais: Donau – há cerca de 2 milhões de anos; Günz, há 700 mil anos;
Mindel há aproximadamente 500 mil anos; Riss, há 300 mil anos e Würm - há cerca
de 150 mil anos.
Em outras ocasiões mais recentes, a Humanidade
experimentou a força da Natureza expressa por grandes crises de saúde: a Peste Negra;
Pandemias de Cólera, de Influenza e de AIDIS; e as Gripes Espanhola,
Asiática e Suína só para lembrar algumas, além de se manifestar por meio de
fenômenos naturais como tornados, tufões, terremotos, maremotos, e tsunamis.
Esses inúmeros
episódios marcam a História de uma Terra viva. Sim, Terra Viva: Pacha Mama (do quíchua Pacha, que significa universo, mundo, tempo ou lugar, e Mama, mãe, Mãe
Terra) a deidade máxima dos povos
indígenas dos Andes centrais, ou Gaia na mitologia grega simbolizando a Mãe-Terra
como elemento primordial e latente de uma
potencialidade geradora imensa.
Aliás, reconhecer
que a Terra está viva provavelmente é tão antigo quanto a própria Humanidade. A
primeira expressão pública desta ideia como fato científico é de um cientista
escocês, James Hutton em 1785. Mais recentemente o britânico James Lovelock
expandiu essa tese com a Teoria de Gaia, elaborando a biografia da Nossa Terra
Viva, em que nos apresenta a Terra como um sistema de vida coerente, autorregulador
e auto mutante, uma espécie de imenso organismo vivo.
A relação do
ser humano com a Terra nos faz ter a falsa ideia de uma prevalência. Ledo
engano. Muitas são as espécies de vida em Gaia, e a vida humana talvez seja uma
das mais recentes nessa evolução. Vírus, bactérias, protozoários, fungos provavelmente
sejam mais antigos que o os animais. Entretanto, algumas espécies de vida são
incompatíveis com outras e especialmente com a pessoa humana. Por isso, para
que esta (a pessoa humana) goze de boa saúde, precisa se proteger daqueles. Daí,
na evolução da ciência médica, serem desenvolvidas antibióticos e vacinas.
Contudo, é preciso saber que sempre conviveremos com o desafio de sobreviver
mesmo sabendo que esses vírus, bactérias, protozoários e fungos aqui estarão e,
mais ainda, se adaptando ao ambiente perpetuando as suas espécies. É um dos
desafios que a Natureza nos impõe.
A partir de
dezembro de 2019 a Humanidade se viu abalada pela mutação do Coronavírus. Uma
espécie nova? Negativo, pois é conhecida desde meados de 1960. Em sua última
mutação provoca uma síndrome respiratória aguda grave denominada pela medicina
como Covid19 (Coronavírus disease 2019).
Uma doença nova para a qual se desconhece, até aqui, o medicamento para sua
neutralização e, muito menos, uma vacina para proteção. Covid19 que compromete
e expõe os sistemas de saúde de todo o mundo. Covid19 que eleva o número de óbitos
espantosamente por todos os países, atacando homens e mulheres independente de
classe social, faixa etária, etnia, religião, seja lá o que for.
O novo
Coronavírus é caprichoso. Ao invés de circular pelo ar, o seu contágio se dá
pelo contato. Por isso, impõe a um ser gregário por natureza – o ser humano, o distanciamento
uns dos outros. Perverso, para reduzir a sua ação de contágio, ele afasta as
pessoas de tudo, confinando grande parte da população mundial em seus habitats
e deixando a mercê dos acontecimentos aqueles tantos que carecem de habitação.
Com o isolamento
social os estabelecimentos são fechados, inclusive as escolas e templos
religiosos. Os negócios despencam. Uma situação surreal.
Porém, em poucos meses, a Natureza segue o seu rumo
em equilíbrio e fenômenos até então inimagináveis passam a ser documentados por
satélites ou imagens. A poluição do ar reduz a níveis que, comparados com o
mesmo período do ano anterior, mostram sensíveis melhoras: Em Nova York, as emissões de
monóxido de carbono oriundas de automóveis diminuiu 50% em comparação ao ano
passado, segundos dados de pesquisadores da Universidade de Columbia revelados à
BBC (²).Os canais de
Veneza, até então bastante poluídos, passam a ter águas cristalinas pelas
quais, ao invés das gondolas, águas vivas passeiam vindas do Mar Adriático: Em meio a pandemia do novo coronavírus que fez o
governo italiano impor medidas de isolamento social, as águas dos canais de
Veneza ficaram mais cristalinas e receberam a visita inusitada de uma
grande água-viva. (³)
A pergunta que persiste em nossa inquietude é: Estaremos
nós, os seres humanos, compreendendo o ensinamento de Gaia para uma de suas espécies?
Estaremos dispostos a alterar o rumo de
nossa suposta evolução impondo danos à Natureza?
Um grande banco afirma na sua campanha
institucional intitulada Reinventando o Futuro. O filme mostra pessoas
em situações novas, em que tiveram que “desaprender e reaprender” outros
formatos para trabalhar (em casa ou mesmo em uma nova configuração nos
escritórios), se conectar, se exercitar, se relacionar e exercer a criatividade
para passar o tempo. E, na locução final, exalta: Até tudo voltar ao
normal; e tudo vai voltar ao normal. Reinvente o futuro! (3)
A que “normal” se sonha voltar? Se pensarmos que o
normal será igual ao de antes, estamos nos iludindo redondamente. Um novo
normal surgirá. Como ele será? Pouco sabemos projetar nesse momento. O certo é:
O novo normal será diferente daquele a que estávamos acostumados, em incalculáveis
sentidos.
O Coronavirus
nos indica: é necessário saltar da zona de conforto para a zona de crescimento da
raça humana. Nessa transição passamos por 4 etapas.
Partindo da zona de
conforto (aquela em que duas palavras de um mandatário eram capazes de ignorar
os alertas de experts), devemos passar pela zona do medo (aquela em que nos encontramos
nesse momento da Pandemia), evoluindo pela zona do aprendizado (em que precisaremos
rever a conduta da sociedade em sua relação com a Natureza), até chegarmos a
zona do crescimento (ao novo normal que há de estabelecer).
Estas
reflexões tratam de algo novo? Pois bem, um brasileiro, empresário da Cidade de
Santos, dinâmico homem de visão, ao assumir a função de Presidente mundial de
uma organização dedicada a apoiar e desenvolver projetos humanitários voltados à
paz e compreensão entre os homens - o Rotary International, deu início ao Programa Preserve o Planeta
Terra, afirmava: Somos os herdeiros da Terra e a nós cabe defendê-la,
protegê-la e preservá-la não só para nós mesmos, mas para nossos filhos e para
os filhos de nossos filhos. (4) Que a lição desse autêntico visionário inspire
a geração atual a mudar o rumo da história, construindo o novo normal em
harmonia com a Natureza, da qual o homem é parte integrante.
(²) https://super.abril.com.br/ciencia/poluicao-atmosferica-cai-mundo-afora-com-a-pandemia-de-covid-19/